quarta-feira, 8 de setembro de 2010

A visão das crianças VI

Entrou para a minha turma uma rapariga que tem os olhos em bico e eu achei-a muito engraçada. Ela fala pouco e o que diz eu não percebo nada. A nossa professora disse-nos que ela veio de muito longe e que não fala português. Eu nem sabia que havia gente que não falava português, e por isso achei engraçado não perceber nada do que ela dizia. Comecei a estar mais com ela e a oferecer-lhe o meu lanche de vez em quando. Ela sorria e dizia qualquer coisa que eu acho que era obrigado.
No outro dia perguntei à minha mãe se podia levar a rapariga com olhos em bico lá a casa e ela respondeu-me:
- O quê? Uma chinesa? Não, absolutamente que não.
Eu não percebi porque não. Eu gostava muito da rapariga de olhos em bico, apesar de não conseguir dizer o nome dela, ela era muito simpática. Esperava sempre por mim à porta da sala e na fila do refeitório. E de vez em quando dava-me um chupa-chupa.
Mas a minha mãe não gostava dela, mesmo nunca a tendo visto, e proibiu-me de estar com ela.
Umas semanas depois fiquei doente e tive que ir para o hospital, o médico que me estava a tratar também tinha os olhos em bico e eu achei estranho a minha mãe não dizer nada e por isso perguntei:
- Oh mãe e deste senhor já gostas?
- O que é que estás para ai a dizer filha?
- Não quero ser tratada por este senhor!
- Porque não?
- Porque não quero, porque me faz lembrar a amiga que perdi. Se não me deixaste estar perto dela porque me deixas estar perto deste senhor agora?
- Não é que eu queira mas ele é o melhor médico daqui e vai tratar bem de ti…
- Ela era minha amiga e fazia-me feliz…

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